Recuperação da renda dos mais pobres perde força nas metrópoles brasileiras no início de 2022, aponta boletim

O estudo mostra que uma trajetória de melhora foi interrompida e a renda dos mais pobres caiu 4,7% no primeiro trimestre de 2022.

A média da renda domiciliar per capita do trabalho dos 40% mais pobres no conjunto das metrópoles brasileiras caiu no 1º trimestre de 2022, chegando a R$240,79 per capita. O resultado veio após cinco trimestres consecutivos de crescimento. Essa e outras informações estão na oitava edição do “Boletim – Desigualdade nas Metrópoles”, produzido em parceria pela PUCRS (Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul), o Observatório das Metrópoles e a RedODSAL (Rede de Observatórios da Dívida Social na América Latina).

Os dados são provenientes da PNAD (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios) Contínua trimestral, do IBGE, e dizem respeito à renda domiciliar per capita do trabalho, incluindo o setor informal. O recorte utilizado é o das 22 principais áreas metropolitanas do país, de acordo com as definições do IBGE. Todos os dados estão deflacionados para o primeiro trimestre de 2022, de acordo com o IPCA.

O estudo mostra que, após uma perda significativa de renda, de 31,9% – chegando a R$183,61, o menor valor da série histórica – entre o 1º trimestre de 2020, último anterior à pandemia, e o 3º trimestre de 2020, foi observado ao longo dos últimos cinco trimestres um lento processo de recuperação.

A renda média dessa parcela da população chegou a R$245,55 no último trimestre de 2021. Porém, entre o final de 2021 e o início de 2022, aquela trajetória de recuperação foi interrompida e a renda dos mais pobres caiu 4,7%, sendo reduzida para o valor de R$240,79 no primeiro trimestre de 2022.

A média geral de rendimentos para todos os estratos também apresentou queda, alcançando no 1º trimestre de 2022, pelo segundo trimestre consecutivo, o pior nível de toda a série histórica iniciada em 2012, com o valor de R$ 1.405,73. No quarto quarto trimestre de 2021 essa média era de R$1414,07. Quando comparamos com a situação no 1º trimestre de 2020, o último antes da pandemia, momento em que a renda média nas metrópoles era de R$1575,51, a redução foi de 10,7%. Desde o início da pandemia, já são oito trimestres de renda média, atingindo os menores valores de toda a série histórica nas metrópoles brasileiras.

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Inflação e mercado de trabalho

Segundo Andre Salata, professor da Escola de Humanidades da PUCRS e um dos coordenadores do estudo, a inflação verificada ao longo dos últimos meses é um dos principais fatores que explicam essa situação. “Quando fazemos os mesmos cálculos desconsiderando a inflação, o que verificamos é inclusive um aumento de 1,98% da renda média geral e, também, da renda média dos mais pobres no último trimestre (em 0,58%)”, explica.

Salata também destaca a debilidade da recuperação do mercado de trabalho como um fator relevante. “Depois de alguns trimestres seguidos de queda na taxa de desocupação, ela ficou praticamente estável em 15,4% entre o final de 2021 e o início de 2022. Além disso, a retomada da economia tem se dado, em grande medida, com base em empregos de baixa qualidade e remuneração”, explica.

Domicílios empobrecidos

O estudo também considera que uma grave consequência deste quadro é que no 1º trimestre de 2022, após cinco trimestres de queda, voltou a aumentar o percentual de moradores do conjunto das metrópoles que viviam em domicílios cuja renda média per capita do trabalho era de até ¼ do salário-mínimo O percentual chegou a a 25,2%. Em termos absolutos, no 1º trimestre de 2022 o número de moradores com rendimento de até ¼ do salário-mínimo correspondia a 21,1 milhões de pessoas.

Este crescimento foi acompanhado pelo aumento da taxa de crianças de até 5 anos de idade que viviam em lares com rendimentos do trabalho inferiores a ¼ do salário-mínimo per capita nas metrópoles brasileiras. Essa taxa alcançou 29,2% da população de crianças, patamar próximo aos 32,2% registrados no auge da pandemia. Em termos absolutos, no 1º trimestre de 2022 havia 1,8 milhões de crianças nessa situação.

Coeficiente Gini da desigualdade

O Boletim também apresenta os resultados da desigualdade de renda mensurada pelo coeficiente de Gini. No 1º trimestre de 2022, o coeficiente de Gini do conjunto das metrópoles brasileiras foi de 0,595. Isso significa uma redução desde o 4º trimestre de 2020. Porém, de acordo também com Marcelo Ribeiro, também coordenador do Boletim Desigualdade nas Metrópoles e professor do IPPUR/UFRJ, “essa redução do Gini, que expressa diminuição das desigualdades de renda em toda a população, se deu pela redução dos rendimentos de todos os estratos de rendimento”, destaca.

Ademais, para Ribeiro, é preciso concluir a partir disso que “os estratos de maior renda (os 10% do topo da distribuição), (o Gini) reduziu proporcionalmente mais do que os estratos de menor renda (os 40% da base da distribuição). Uma redução das desigualdades onde todos perdem não pode ser comemorada como aumento da equidade social”, ressalta.