LAI completa sete anos e ainda enfrenta desafios

Em 23 de novembro do ano passado, o secretário-geral da ONG Contas Abertas, Gil Castelo Branco, fez uma denúncia na ouvidoria de uma autarquia federal por causa do uso irregular de um carro oficial em Brasília. Sem obter retorno, ele buscou o órgão em janeiro deste ano e tentou saber quais as providências tomadas. Para a verificação, ele acionou a Lei de Acesso à Informações (LAI).

Conforme a LAI, “o órgão ou entidade pública deverá autorizar ou conceder o acesso imediato à informação disponível”. Não sendo possível o acesso imediato, a lei estabelece um prazo para responder o pedido, “o órgão ou entidade que receber o pedido deverá, em prazo não superior a 20 (vinte) dias”. Apesar da norma, Castelo Branco ainda não obteve retorno. Depois de alguns adiamentos, ele aguarda a informação para 22 de maio, conforme foi avisado pela autarquia.

“De maneira geral, políticos e autoridades não gostam de ser fiscalizados. Isso extrapola partidos políticos”, afirma Castelo Branco. Há mais de uma década, ele está à frente da ONG que lida com o monitoramento do orçamento público federal.

Avanços

Apesar da demora em obter resposta sobre o episódio envolvendo o carro oficial, Castelo Branco avalia positivamente a LAI. “Essa lei criou oportunidade para termos acesso a documentos que até então eram impossíveis. A transparência aprimora o gasto, a qualidade da despesa, a legalidade do ato, além de ser um direito do cidadão. Nada mais é importante do que saber para onde estão indo os recursos obtidos com o pagamento de impostos”, explica Gil.

“Nós enfrentamos dificuldades que seriam muito maiores se a lei não existisse”, crê o especialista. “O problema maior é mudar uma cultura. Mudar a cultura do sigilo e do secreto que prevaleceu durante tantos anos”, acrescenta.

Flávio Unes, presidente da Comissão Especial de Proteção de Dados da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), faz coro em defesa da LAI, que “apenas inaugurou a provocação de mudança da cultura de sigilo”. Ele avalia que implementação ideal da LAI em todos os níveis de Federação (União, estados e municípios), “vai exigir o treinamento de pessoal, mais atuação por parte dos órgãos de controle e do Judiciário”.

Transporte de órgão

Marina Iemini Atoji, gerente-executiva da Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji), acrescenta que além da diferença de aplicação da LAI entre os entres da Federação, há desníveis entre os Três Poderes.

“Tradicionalmente, o Executivo federal apresentou índices razoáveis de atendimento a pedidos de informação. Mas, têm havido relatos mais frequentes de dificuldades para obter respostas a pedidos. O Legislativo federal tem diferenças entre si: a Câmara apresenta melhor capacidade de atendimento do que o Senado. O Judiciário ainda impõe obstáculos significativos – dependendo do tribunal, é difícil até mesmo apresentar o pedido de informações”, detalha.

A gerente-executiva da Abraji se recorda de reportagens que foram possíveis graças ao acesso a informações via LAI, como a matéria de O Globo (junho de 2016) que “mostrou o número de negativas de uso de aeronaves da FAB {Força Aérea Brasileira] para transporte de órgãos para transplante”. A publicação da reportagem “gerou mudança na regulamentação da atividade, aumentando o número de transporte de órgãos para transplante”, lembra-se.

Cidadão comum

Para Manuel Galdino, diretor-executivo da Transparência Brasil, jornalistas e “quem trabalha com transparência de informações” foram os mais beneficiados com a Lei de Acesso à Informação. Ele sublinha que a legislação “é bastante avançada”. No entanto, “o cidadão comum usa muito pouco a LAI”. Segundo o especialista, “muitos não sabem sequer da existência e que é um direito. O desafio maior da LAI é ampliar o número de pessoas que conhecem a lei e a utilizam”.

O advogado Flávio Unes defende que o cidadão comum tenha mais protagonismo e iniciativa. “Ser cidadão dá trabalho”, comenta. Ele ressalta, porém, que é preciso mais esforços dos órgãos públicos para propiciar informação a pessoas comuns.

“Cumprir a lei, disponibilizando de forma mais didática e eficiente as informações requer investimento. Gastos em tecnologia, em equipamento, em treinamento de pessoal para que institucionalmente haja essa cultura e essa expertise. Em municípios menores, há uma dificuldade maior, mas isso não é razão para omissão total desses entes”, critica o representante da OAB.

Análise feita em 2018 pela ONG Transparência Brasil sobre mais de dez mil pedidos de acesso à informação recebidos pelo Executivo federal e por outros 33 órgãos das diferentes esferas de poder e níveis federativos e em todos os poderes, verificou que “via de regra os órgãos públicos não utilizam linguagem clara para se comunicar com os cidadãos, tampouco têm uma gestão adequada dos documentos e dados que produzem”.

A Agência Brasil tentou ouvir o Ministério Público junto ao Tribunal de Contas da União (TCU) a respeito da LAI, mas não teve sucesso. A Procuradoria-Geral da República informou que prepara para este ano “ranking da transparência educacional” sobre órgãos que aplicam verbas federais na educação. A PGR já produziu duas edições do ranking nacional da transparência (2015 e 2016), ainda disponíveis na internet.

Avaliação feita pela CGU no ano passado junto a 691 entes federativos –  estados, Distrito Federal e todos os municípios com mais de 50 mil habitantes -,indica que desse universo, 67,4% publicam informações sobre despesas espontaneamente em sites próprios; 58,7% publicam todos os dados avaliados sobre licitações; 79,6% publicam dados detalhados sobre servidores públicos (nome, cargo e remuneração); 60,4% publicam informações sobre pagamento de diárias; e 45,4% divulgam a regulamentação da LAI em local considerado de “fácil acesso”.

E hoje (16), a CGU divulgou um balanço dos atendimentos feitos a partir da criação da lei.